-
Puta que o pariu! Que encheção de saco essa história dos despejos.
Tá cheio de nego na rua agora torrando a paciência. Que que esse
filha da puta tinha que tirar essas pessoas daquele prédio? Não
tavam incomodando ninguém, tava até abandonada aquela merda antes.
Mas
tudo bem… E sou estoico, manja? Ah, é, te falei daquela vez já.
É, então, isso quer dizer que eu procuro aceitar as coisas que não
posso mudar… Não, não tem nada a ver com acomodado! Tem a ver com
reconhecer que nem tudo tá ao nosso controle, que tem coisas que dá
pra mudar e outras não. Simples assim. É uma atitude filosófica,
saca? Por isso que não adianta eu ficar puto com essa história
porque não tem nada que eu possa fazer. E ficar puto não vai me
levar a lugar nenhum. Claro que ficar de braços cruzados não muda
nada, mas ficar se lamentando num canto também não. O que dá para
fazer é pensar nas coisas que dá pra mudar e mudar essas coisas aí…
Por
exemplo? Sei lá eu. Não tô na pele dessa gente também. Com eles a
coisa é bem mais complicada, tem família, criança, essas parada.
Se fosse eu ia logo procurar outra aba pra morar, de preferência bem
longe da atenção dos outros. Sim, eu sei que eles tem um projeto,
uma luta comum – eu também converso com as pessoas – só tô
dizendo o que eu faria na situação deles. Pra mim e pro Platão não
muda muito, a gente vive simples. Aumenta a concorrência nos apoio,
reduz a tolerância das pessoas, mas nada que nos assuste.
Certa
feita, a gente tava numa ocupação destas, mais por ocasião do que
por convicção. O Platão tava numa peste horrenda e tinha um
pessoal lá dando assistência médica pra pessoa e pra bicho. Gente
universitária, gente nova, cheia de ideias e sonhos, conhece o tipo?
Nos abancamos uma semana num prédio do governo e ficamos lá até o
Platão melhorar. Tinha tudo quanto é tipo de gente lá. E no meio
daquele povo todo a gente conheceu uma guria muito simpática. Dessas
de movimento social, muito preocupada com todo mundo e muito querida.
Só que a moça tinha umas crise braba de ansiedade, atacava os nervo
e ela passava mal de tão preocupada com tudo que ela era. Preocupava
com a comida que podia faltar, com os home que podiam cair descendo
sarrafo a qualquer momento, com as briga que podiam acontecer lá
dentro, com tudo. E pior que de tão ansiosa que a coitada era ficava
até insegura. Imagina só, uma moça estudada daquelas com medo ou
vergonha de barbado vagabundo. Vai entender.
Mas
o pior é que aconteceu de bem no dia que os home finalmente chutaram
a porta pra desocupar, a coitada tava sozinha com uma dúzia de
crianças na ocupa. O resto do pessoal da organização tava numa
reunião, acho. Não lembro direito. Só sei que foi um chororô
geral, capacete e coturno pra tudo que é lado. Os meganha gritando
com sangue no olho e aquela criançada berrando e correndo pras
barraca. Tu não faz ideia da confusão que foi aquilo! E podia ter
sido muito pior, não fosse a guria essa ter pensado rápido, tomado
a frente da situação e ter ido logo falar com o tal capitão.
Peitou
o home de farda e explicou tudinho. Disse que só tinha criança ali,
que não tinha necessidade daquilo tudo e que eles iam cooperar. Deve
ter falado firme, porque o home entendeu a situação. Logo depois
retirou as tropa e deixou eles se organizarem pra desocupar. Acho até
que ela negociou a retirada das coisa tudo, sem despejo e sem
ignorância. Baita atitude da guria! E pra tu vê, no fim não
adiantou de nada toda aquela preocupação antecipada. Os home
brotaram do nada e o jeito foi negociar conforme a situação. Não
desesperar, não ficar se lamentando, mas trabalhar em cima do que
pode ser trabalhado. Isso é ser estoico, entende?
Eu?
Eu não fiz nada. Ajudei a tirar e desmontar as coisa depois. É que
eu tenho alergia aguda à autoridade, sabe? Não posso chegar muito
perto. O Platão aqui também não simpatiza muito, não. Ele tem uma
história complicada com ela. Mas isso eu te conto outra hora que
sequei a goela aqui de tanto falar. Por falar nisso, podia nos dar um
apoio pruma guaraná aí, né?
Grande!
Muito obrigado, mestre! Cola aí outra hora que te conto a história
do Platão e as autoridades, tá.
______________
* Advertência: Leia em voz alta


Nenhum comentário:
Postar um comentário